“Alarga o espaço da tua tenda” (Is 54,2)

Após ouvir várias vozes da Igreja por todo o Brasil, a CNBB optou por trabalhar na Campanha da Fraternidade de 2024 o tema “Fraternidade e Amizade Social”, escolhendo como lema, baseado no Evangelho de Mateus, “Vós sois todos irmãos e irmãs” (cfe. Mt 23,8).

Folheando o livro-base da Campanha da Fraternidade, encontramos todo o embasamento teórico – bíblico, filosófico, cristão e social – proposto para reflexão nesta Quaresma, desde considerações de Homero, Sócrates e Platão sobre a importância das relações humanas, passando por diversas falas do Papa Francisco (especialmente na Fratelli Tutti), até chegar nas sugestões de ações pessoais, comunitárias e sociais que podem transformar nossa realidade e das pessoas que nos cercam.

Gostaria de me ater especialmente no versículo que nomina este texto – versículo este que abre o capítulo do “AGIR” no Texto-Base da CF-2024.

Neste mundo globalizado e polarizado que vivemos, onde as atitudes do “pirão pouco, o meu primeiro” são cada vez mais comuns e presentes, precisamos abrir espaço em nossas “tendas” – nossa vida, nosso pensar, nosso sentir e nosso agir – para aqueles que não compartilham conosco – seja a fé, a presença, a opinião, o cuidado, o amor, a compaixão, a empatia, a atitude, a fraternidade, a opção sexual, o time de futebol, o estilo musical, a forma de expressão, a cor preferida… –, porque é o saber conviver com o diferente do que somos que nos faz crescer como seres humanos.

“Alargar a tenda” significa deixar-se aproximar de alguém, conviver com este alguém, compartilhar momentos e experiências, porém tendo a consciência que sua estrada e sua vida só você a vive, de acordo com as escolhas que você faz – porque a vida desse alguém pode te trazer uma forma diferente de analisar e vivenciar a mesma realidade –, tendo ainda a possibilidade de poder acrescentar novas tintas, luzes e cores à tela da sua vida simplesmente com a troca das lentes (empatia) que você encara o mundo.

Transcrevo, a seguir, um trecho do Texto-Base da Campanha da Fraternidade deste ano de 2024 que nos traz uma explicação não só para a utilização deste versículo de Isaías no contexto bíblico, mas nos inspira em nossas atitudes nestes tempos onde relacionar-se com o próximo tornou-se uma arte de difícil execução:

124. ‘A palavra do profeta recorda ao povo no exílio a experiência do êxodo e da travessia do deserto, quando habitava nas tendas, e anuncia a promessa do regresso à terra, sinal de alegria e esperança. Para se preparar, é necessário alargar a tenda, agindo sobre três elementos da sua estrutura. O primeiro são as lonas, que protegem do sol, do vento e da chuva, delineando um espaço de vida e de convivência. É preciso estendê-las, de modo que possam proteger também aqueles que ainda se encontram fora deste espaço, mas que se sentem chamados a entrar. O segundo elemento estrutural da tenda são as cordas, que mantêm juntas as lonas. Devem equilibrar a tensão necessária para evitar que a tenda se debilite com a frouxidão, [enfraquecendo] com os movimentos provocados pelo vento. Por isso, se a tenda se alarga, devem aumentar-se para manter a justa tensão. Por fim, o terceiro elemento são as estacas que fixam a estrutura ao solo e asseguram a solidez, mas permanecem capazes de serem movidas quando se deve armar a tenda noutro lugar. A resistência da tenda é assegurada pela robustez das suas estacas, ou seja, os fundamentos da fé que não mudam, mas podem ser deslocados e colocados em terrenos sempre novos, de modo que a tenda possa acompanhar o povo que caminha na história. (…) É assim que muitos imaginam a Igreja: uma morada ampla, mas não homogênea, capaz de dar abrigo a todos, mas aberta, que deixa entrar e sair (cf. Jo 10,9), e em movimento para o abraço com o Pai e com todos os outros membros da humanidade. Alargar a tenda exige acolher outros no seu interior, dando espaço à sua diversidade’. 125. Alargar os espaços das nossas tendas significa que, ‘perante as várias formas atuais de eliminar ou ignorar os outros, sejamos capazes de reagir com um novo sonho de fraternidade e amizade social que não se limite a palavras’ (FT, n. 6).”

E não há como se evitar as perguntas: “Como é e está arrumada a tua tenda”? “Para que ou para quem você costuma alargar a tua tenda?” “O que ou quem que não cabe na tua tenda (e que você quer que caiba)?”


Leila Denise

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