Dias atrás, nossa equipe do “Conexão Fraterna” comentava que está fácil de encontrar na internet “receitas prontas” para viver uma “Quaresma Santa” – e muitas delas, por sinal, distorcem alguns conceitos básicos dos preceitos quaresmais.
Não houve, então, como evitar o questionamento: Qual a finalidade da Quaresma para os cristãos?
A Quaresma é o período que se inicia na Quarta-Feira de Cinzas e finda com a Ressurreição de Cristo.
É um período propício para uma revisão de vida, a fim de que, para as comemorações da Páscoa do Senhor, possamos estar preparados para vivenciar a Graça de Deus de uma forma plena, em comunhão com o Criador, nos vários aspectos da vida cristã.
O que se observa frequentemente, tanto na convivência pessoal quanto nas redes sociais, é que algumas pessoas entendem que é possível “negociar com Deus”: elas se privam de algo que gostam muito na Quaresma (um “sacrifício”) simplesmente porque esperam de Deus uma graça específica em suas vidas – que elas julgam ser melhores ou mais convenientes para suas vidas (por exemplo, um emprego melhor).
E isso preocupa, porque algumas pessoas se prendem muito mais no sacrifício como meio de alcançar um fim do que propriamente na graça de Deus ou na vivência de seus ensinamentos no dia-a-dia.
Sabemos que muitas pessoas têm buscado essas práticas por diversos motivos – como ser uma pessoa cristã melhor, pela salvação de almas ou para ser aceitos perante algumas lideranças e grupos mais conservadores –, e que algumas acabam se privando de coisas (comidas, bebidas) ou situações (horas de sono, momentos de lazer), algumas delas, inclusive, que podem refletir diretamente em nossa saúde física e emocional.
Pessoalmente, gostaria de alertar para os excessos – seja pelo total desprezo de alguns a essas práticas de vivência da fé, seja pela adoção de medidas extremadas que ajam sobre nós e nossos corpos como se tóxicas fossem.
Não entendo ser um problema fazer jejum, penitência e oração – inclusive, esses são caminhos apontados pelo próprio Cristo –, nem fazer suas orações durante a madrugada. Os ensinamentos que Jesus Cristo nos deixou nos Evangelhos e os exemplos de vidas reconhecidamente santas podem nos dar um caminho a seguir, não sendo necessário pagarmos por nenhuma “receita pronta de santidade”. Somente precisamos ter plena compreensão do real significado das coisas e qual é o nosso real objetivo ao escolhermos agir dessa forma.
Na última reunião da Região Pastoral da nossa diocese (Lages), recebemos um convite do Conselho Pastoral da Diocese (CPD), datado de 18/02/2025, para vivenciarmos de uma forma mais efetiva a nossa Quaresma, com especial foco no Ano Jubilar da Esperança e na Campanha da Fraternidade deste ano de 2025. Peço licença para replicar uma parte do texto, que entendo se encaixar muito bem para esta situação: “Pela graça de Deus, somos bem mais do que aquilo que fazemos! Muito mais do que buscar indulgências, busquemos ser indulgentes e misericordiosos em nossas relações”.
Nessa mesma reunião, nosso bispo diocesano pediu que lembremos que não basta todas essas demonstrações externas de vivência da fé se não vivenciarmos, em nossos atos e pensamentos mais íntimos, não exercitarmos, de forma conjunta e prática, o Amor e a Misericórdia.
Inclusive, o Papa Francisco encerra a Bula de Proclamação do Jubileu Ordinário do ano 2025, “Spes non confundit”, com as seguintes palavras: “No caminho rumo ao Jubileu, voltemos à Sagrada Escritura e sintamos, dirigidas a nós, estas palavras: «Nós que procuramos refúgio nele, encontramos grande estímulo agarrando-nos à esperança proposta. Nessa esperança, temos como que uma âncora segura e firme da alma, que penetra até ao interior do véu, onde Jesus entrou como nosso precursor» (Heb 6, 18-20).É um forte convite a nunca perder a esperança que nos foi dada, a mantê-la firme, encontrando refúgio em Deus. A imagem da âncora é sugestiva para compreender a estabilidade e a segurança que possuímos no meio das águas agitadas da vida, se nos confiarmos ao Senhor Jesus. As tempestades nunca poderão prevalecer, porque estamos ancorados na esperança da graça, capaz de nos fazer viver em Cristo, superando o pecado, o medo e a morte. Esta esperança, muito maior do que as satisfações quotidianas e as melhorias nas condições de vida, transporta-nos para além das provações e exorta-nos a caminhar sem perder de vista a grandeza da meta a que somos chamados: o Céu. Portanto, o próximo Jubileu há de ser um Ano Santo caraterizado pela esperança que não conhece ocaso, a esperança em Deus. Que nos ajude também a reencontrar a confiança necessária, tanto na Igreja como na sociedade, no relacionamento interpessoal, nas relações internacionais, na promoção da dignidade de cada pessoa e no respeito pela criação.Que o testemunho crente seja fermento de esperança genuína no mundo, anúncio de novos céus e nova terra (cf. 2 Ped 3, 13), onde habite a justiça e a harmonia entre os povos, visando a realização da promessa do Senhor. Deixemo-nos, desde já, atrair pela esperança, consentindo-lhe que, por nosso intermédio, se torne contagiosa para quantos a desejam. Possa a nossa vida dizer-lhes: «Confia no Senhor! Sê forte e corajoso, e confia no Senhor» (Sal 27, 14). Que a força da esperança encha o nosso presente, aguardando com confiança o regresso do Senhor Jesus Cristo, a Quem é devido o louvor e a glória agora e nos séculos futuros.” (São João de Latrão, 09/05/2024)
Inevitável me perguntar:
“Como estou me preparando nesta Quaresma para a Páscoa?”;
“Como estou vivenciando o Jubileu da Esperança?”;
“Como encaro as propostas da Campanha da Fraternidade deste ano de 2025?”;
“O que pretendo fazer para que todos esses ensinamentos sejam parte efetiva de minha vivência da fé, não só hoje, mas por toda a minha vida?”
Leila Denise