“Deus ama apenas quem convive com a sabedoria” (Sb 7,28)

No restaurante onde almocei com a minha família – de comida japonesa – costumam dar um biscoito da sorte para quem tirar a louça da mesa. No meu veio escrita a seguinte frase: “Sábio é aquele que não se considera sábio”.

Inspirada por esta frase, tive diversos pensamentos, mas o primeiro deles foi que, reforçado pela frase acima, o verdadeiro sábio conhece e pratica a humildade – pois não há espaço para a sabedoria onde a arrogância se faz presente.

Dias atrás, ouvi um padre dizer em uma reunião – com propriedade – que ele ficava triste quando ouvia algumas pessoas confundirem a origem em uma família de poucos recursos financeiros com uma “família humilde”. Por mais que a palavra “humildade” venha do termo “húmus” (terra, adubo), há uma distância considerável entre pobreza e humildade.

A “esposa Pobreza”, como dizia o Francisco de ontem, tem muito a ver com o desapego dos bens e riquezas materiais do que com a falta de condições financeiras; já a humildade, ainda que muitas vezes seja “acondicionada” pela pobreza, tem muito mais relação a não se considerar melhor do que outras pessoas, em quaisquer aspectos que se possa analisar – e não apenas financeiro, mas também moral e intelectual.

Não há espaço para o cultivo da humildade onde não se respeita as diferenças, onde não se valoriza as culturas e/ou valores de um povo ou seus descendentes, onde não há qualquer preocupação com os sentimentos das outras pessoas.

Já disse uma vez neste espaço que não me considero uma pessoa humilde – por conseqüência, tampouco me vejo como alguém sábio –, mas a cada dia tento ser uma pessoa melhor, exercitando, através da empatia, a capacidade de entender o que move quem me cerca e valorizando o que cada uma delas tem que me faz enxergar o meu Deus no próximo que elas são na minha vida.

O Francisco de hoje nos lembra que Maria exerceu a humildade como poucos entre nós: 

“O segredo de Maria é a humildade. Foi a humildade que atraiu o olhar de Deus sobre ela. O olhar humano procura sempre a grandeza e fica deslumbrado com o que é ostensivo. Deus, ao contrário, não olha para as aparências, Deus olha para o coração (cf. 1 Sm 16, 7) e encanta-se com a humildade: a humildade do coração encanta Deus. Hoje, olhando para a assunção de Maria, podemos dizer que a humildade é o caminho para o Céu. A palavra “humildade” deriva do termo latim humus, que significa “terra”. É paradoxal: para chegar ao alto, ao Céu, é preciso permanecer baixo, como a terra! Jesus ensina: «Aquele que se humilha será exaltado» (Lc 14, 11). Deus não nos exalta pelos nossos dons, pelas riquezas, pela capacidade, mas pela humildade; Deus é apaixonado pela humildade. Deus eleva aqueles que se abaixam, que servem. De fato, Maria nada mais atribui a si mesma do que o “título” de serva: é «a serva do Senhor» (Lc 1, 38). Nada mais diz sobre si, nada busca para si. Hoje, então, podemos perguntar-nos, cada um de nós, no nosso coração: como estou em humildade? Procuro ser reconhecido pelos outros, afirmar-me e ser elogiado, ou penso em servir? Será que sei ouvir, como Maria, ou só quero falar e receber atenções? Será que sei ficar em silêncio, como Maria, ou estou sempre a tagarelar? Sei retroceder, desanuviar contendas e argumentos, ou procuro apenas sobressair sempre? Pensemos nestas questões: Como estou em humildade? Maria, na sua pequenez, é a primeira a conquistar os céus. O segredo do seu sucesso reside precisamente em reconhecer-se pequena, em reconhecer-se necessitada. Com Deus, apenas quantos se reconhecem como nada são capazes de receber tudo. Apenas aqueles que se esvaziam de si são preenchidos por Ele. E Maria é a «cheia de graça» (v. 28) precisamente por causa da sua humildade. Para nós também, a humildade é sempre o ponto de partida, o início do nosso ter fé. É essencial ser pobre de espírito, ou seja, necessitadode Deus. Aquele que está cheio de si não dá espaço a Deus – e nós frequentemente estamos cheios de nós mesmos – mas quem permanece humilde permite que o Senhor realize grandes coisas (cf. v. 49)”.

Angelus, Praça São Pedro, 15/08/2021

Todas as perguntas que o Papa Francisco faz acima cabem a cada um de nós.

 E como, sabiamente, responderemos a elas?


Leila Denise

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