“Chegue à tua presença o meu clamor, Senhor!” (Sl119,169)

Vivemos um momento da história onde nos deparamos com as notícias diárias nos trazendo um cardápio tão sangrento que talvez apenas um vampiro conseguisse degustá-las e apreciar com prazer seu sabor: mais de 650 mil mortos pela COVID-19 somente no Brasil, as vítimas dos “acidentes naturais” (como a tragédia de Petrópolis e as enchentes país afora)… e agora, também, as vítimas (não só os mortos) do abandono e do desespero que o movimento das tropas no Leste Europeu trouxe de volta ao mundo – e com o “brinde” do risco de uma “guerra mundial”…

Normalmente não costumo trazer cores muito fortes para este espaço, mas está difícil ignorar o verde se transformando no marrom da lama, as águas translúcidas se transformando em corredeiras escuras e cheias de armadilhas que elas mesmas carregaram pelo caminho afora, os tons pastéis da paz manchados com o rubro da vida alheia – sem causar sequer um mínimo rubor nos governantes pouco preocupados com a paz.

Como já comentei, não me considero uma cristã exemplar – muito longe disso, inclusive… Mas neste momento de tanta dor compartilhada, meu questionamento talvez seja mais ofensivo: “É Deus que está ‘surdo’? Ou são nossas obras que estão ‘mudas’?”

Ainda, falando em ouvir e escutar, o Papa Francisco nos propõe, através do Sínodo “Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”, por ele iniciado e que, neste período de 2022, vivencia sua experiência no seio de cada comunidade, pois convida a Igreja inteira (não só o Clero, como nos tempos anteriores, mas toda a Igreja) a refletir sobre um tema decisivo para a sua vida e a sua missão: “O caminho da sinodalidade é precisamente o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio”.

Esta é uma oportunidade de expressarmos nossa opinião – seja em nossa comunidade cristã, seja através do engajamento em entidades que trabalham pelo Bem Comum – sobre a Igreja que somos e a Igreja que queremos ser: todos caminhando juntos.

Agora, vocês devem estar se perguntando: “o que a nossa opinião tem a ver com as ‘desgraças do mundo’ que vivemos?”

A meus olhos, tudo a ver. Se conseguirmos ouvir o mundo que nos cerca, e, através do diálogo fraterno (exercitando o amor e a misericórdia que Cristo nos ensinou), chegarmos a um consenso de qual caminho seguir, saberemos o que, quando, onde e como fazer o que for necessário para auxiliarmos qualquer pessoa que sofre.

O Papa Francisco, nos deixa alguns preciosos pensamentos sobre a indiferença com os irmãos: ”Jesus ensina-nos a ser misericordiosos como o Pai… Muitas vezes a indiferença procura pretextos: na observância dos preceitos rituais, na quantidade de coisas que é preciso fazer, nos antagonismos que nos mantêm longe uns dos outros, nos preconceitos de todo o gênero que impedem de nos fazermos próximo. A misericórdia é o coração de Deus. Por isso deve ser também o coração de todos aqueles que se reconhecem membros da única grande família dos seus filhos; um coração que bate forte onde quer que esteja em jogo a dignidade humana, reflexo do rosto de Deus nas suas criaturas… É por isso que ‘é determinante para a Igreja e para a credibilidade do seu anúncio que viva e testemunhe, ela mesma, a misericórdia. A sua linguagem e os seus gestos, para penetrarem no coração das pessoas e desafiá-las a encontrar novamente a estrada para regressar ao Pai, devem irradiar misericórdia. A primeira verdade da Igreja é o amor de Cristo. E, deste amor que vai até ao perdão e ao dom de si mesmo, a Igreja faz-se serva e mediadora junto dos homens. Por isso, onde a Igreja estiver presente, aí deve ser evidente a misericórdia do Pai. Nas nossas paróquias, nas comunidades, nas associações e nos movimentos – em suma, onde houver cristãos –, qualquer pessoa deve poder encontrar um oásis de misericórdia’”.

Mensagem para o 49º Dia Mundial da Paz, no Ano Jubilar da Misericórdia (01/01/2016).

Não basta somente clamarmos aos céus, esperando por uma solução mágica enquanto apenas assistimos. É tempo de ouvirmos o que pensa quem está próximo de nós. É tempo de pensarmos no Bem Comum. É tempo de tornarmos nossa Igreja cada vez mais na Igreja que vivencia o Amor e a Misericórdia de que o Cristo falou.

E aí? Topa?

Um abraço fraterno, paz e bem.

Leila Denise

Acervo de Imagem: CFJ 2019 – Curitibanos SC

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