800 anos das Chagas: “São Francisco, o inabitado por Deus”

Nosso Seráfico Pai, São Francisco de Assis, recebeu os Sagrados Estigmas dois anos antes de sua morte. Estes estigmas representaram o ápice de seu calvário, pois o santo cumpriu perfeitamente o que São Paulo escreveu em sua carta: “Se já morremos com Cristo, cremos que também com Ele viveremos” (Rm 6,8). O calvário de Cristo foi também o de Francisco. Desde o presépio, Cristo foi preparado para o calvário; de forma semelhante, desde o momento em que Francisco se encontrou com o Crucificado, ele começou sua preparação para receber os estigmas.

No encontro com o Crucificado, nasceu em Francisco uma amizade profunda com Cristo. Essa amizade foi marcada pela pergunta: “Senhor, que queres que eu faça?”. Ao fazer essa pergunta, Francisco permitiu que Deus nascesse em sua alma. Quando Maria disse: “Faça-se em mim segundo a tua vontade”, ela já estava plena do Espírito Santo. Maria foi habitada por Deus antes mesmo de Sua encarnação em seu ventre, por isso ela é Imaculada desde a concepção. A Imaculada não significa apenas a ausência de pecado, mas também que Maria era completamente habitada por Deus.

“Senhor, que queres que eu faça?” – quando Francisco pronunciou essas palavras, não era apenas uma curiosidade pela resposta, mas um desejo sincero de permitir o nascimento de Deus em sua alma. E, naquele instante, a inabitação divina ocorreu. O Crucificado penetrou em seu corpo, e assim teve início o calvário de Francisco. Como o próprio Francisco afirmou: “Já não sou eu quem vivo, mas é Cristo que vive em mim”. A partir daquele momento, Cristo habitava Francisco, e o mistério da inabitação divina se manifestou de forma plena. Contudo, para seguir esse caminho, Francisco precisava, como Jesus Cristo instruiu seus discípulos, “tomar sua cruz e segui-Lo”.

Cartaz do VIII Centenário de Frei Benedito Geraldo Gomes Gonçalves, frade da Província da Imaculada Conceição do Brasil

A via da pobreza como calvário

Francisco desposou a pobreza, a dama mais bela e pura de seu coração. Neste “Sacro Commercium”, ele tomou a pobreza não apenas como esposa, mas como via e calvário para chegar ao Esposo. Assim como Cristo foi despojado de Suas vestes, Francisco, habitado por Cristo, também se despojou em praça pública. Assim como Cristo clamou: “Pai, afasta de mim este cálice”, Francisco, possuído por Cristo, proclamou: “Até hoje chamei Pedro Bernadoni de pai; a partir de agora, chamo: Pai Nosso que estás no céu”. O Divino Amigo de Francisco começou a prepará-lo para imprimir em seu corpo a marca de Seu amor. Maria cantou: “O Poderoso fez em mim maravilhas”; em Francisco, o Poderoso dilacerava sua alma de amor. Em vários relatos, há menções de que Francisco chorava de amor por seu Divino Amigo, um amor que o consumia por dentro, pois Cristo habitava em sua alma. Para que alguém seja habitado por Deus, ele precisa se despojar, fazer uma via, um caminho, um calvário.

De inabitado a habitado

Toda a vida de Francisco foi marcada pelo mistério da inabitação divina. Na sua oração diante do Crucificado, ele rogava: “Altíssimo, glorioso Deus, ilumina as trevas do meu coração”. Cristo iluminava as trevas do coração de Francisco porque já habitava ali no mistério da inabitação. Deus iluminava Francisco de dentro para fora, irradiando ternura e amor. Quando lemos sobre a vida de Francisco, seja em seus escritos ou nas obras de seus hagiógrafos, percebemos que Deus não apenas estava presente em sua vida, mas habitava de tal forma que Francisco podia abençoar seus irmãos até o fim dos tempos. Tal bênção transcende Francisco, remetendo a Deus, que é eterno e habitava nele.

“Vós sois toda nossa riqueza até a saciedade” (Bilhete a Frei Leão). Francisco estava repleto de Deus, totalmente tomado por Ele. Assim como alguns santos, Francisco foi tocado de forma especial. Deus não apenas quis habitar sua alma, mas também seu corpo, selando-o com as chagas de amor. O que antes era invisível e habitava dentro dele tornou-se visível no mistério de seu corpo. As chagas de Cristo em seu corpo marcaram o ponto culminante do calvário de São Francisco, pois ele se transformou por completo no objeto de sua contemplação.

Pintura de Sofia Novelli

“Vendo isso, Francisco ficou estupefato, e seu espírito experimentou alegria misturada com dor: enquanto contemplava a graciosa forma de Cristo, que lhe aparecia de maneira tão maravilhosa, sentia extrema alegria, mas a cruel crucifixão transpassava sua alma com a dor da compaixão. Instruído interiormente por quem lhe aparecia exteriormente, compreendeu que, embora a dor da paixão não fosse compatível com a imortalidade do espírito seráfico, a visão lhe fora apresentada para que ele soubesse que devia transformar-se totalmente, não pelo martírio da carne, mas pelo incêndio do espírito, na semelhança do Cristo Crucificado. Após um colóquio secreto e familiar, ao desaparecer, a visão inflamou seu espírito com ardor seráfico e marcou-lhe exteriormente a carne com a imagem do Crucificado, como se ao fogo seguisse a impressão de um selo” .

(LM VI, 2)

Boas festas!

Frei Jhones Lucas Martins


Desde o início de setembro, estamos publicando semanalmente vídeos com reflexões sobre os 800 anos das Chagas de São Francisco de Assis. Os vídeos foram gravados por Frei Fidêncio Vamboemmel, Moderador da Formação Permanente da Província da Imaculada Conceição do Brasil, durante sua visita ao Monte Alverne em maio deste ano. Confira abaixo os vídeos que estamos compartilhando!

Neste episódio, mergulhamos na profunda espiritualidade de São Francisco de Assis e exploramos a origem do seu amor pelo Crucificado. Descubra como as Chagas, que marcam 800 anos, transformaram a vida do santo e a sua devoção.
Neste segundo episódio, Frei Fidêncio Vanboemmel apresenta as práticas espirituais que aprofundaram o amor de São Francisco pelo Crucificado.
Neste terceiro episódio, Frei Fidêncio Vanboemmel explora o significado profundo das Chagas de São Francisco de Assis no contexto de sua época. Entenda como essas marcas sagradas não apenas simbolizavam sua união com Cristo, mas também refletiam o ambiente religioso e social do século XIII.
No episódio final de nossa série, refletimos sobre a mensagem das Chagas de São Francisco de Assis para a humanidade.

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