Vamos falar sobre o “Dia da Consciência Negra”?

Olá, Franciscanos!

Paz e Bem!

Queridos, hoje é  dia da Consciência Negra, é lógico que o Conexão Fraterna não podia ficar de fora desse dia tão importante. Nosso convidado de hoje é um irmão muito especial, o Jefferson Machado, historiador, membro da OFS, que tem muito para nos falar….

Sem mais delongas, vamos lá!

Stalkeando …

Nome: Jefferson Eduardo dos Santos Machado
Idade: 51
Profissão: Professor/Historiador
Música Preferida: Olhos coloridos-Sandra de Sá
Filme/Série: Filme: Mariguela
Instagram: @jeffersonofs

Facebook : @jeffersonmachado

Personalidade inspiradora: Desmond Tutu


1–  Você pode nos contar como esse dia foi instituído?

Essa data foi instituída a partir da iniciativa de um grupo de jovens negros de Porto  Alegre que em 1971 decidiram questionar a legitimidade do dia 13 de maio, dia em que foi assinada a Lei Áurea, como data referência da celebração do povo negro. Em suas pesquisas, descobriram que em 20 de novembro, Zumbi, o líder do Quilombo 

dos Palmares foi morto. Decidiram então marcar esse dia como o momento de destaque a luta dos ex-escravizados por liberdade e gerar reflexão para as questões raciais. Esse movimento realizado pelo então denominado grupo Palmares, foi um dos marcos da constituição dos movimentos negros e está na raiz do Dia da Consciência Negra.

2 -Como você vê a luta diária dentro das instituições, principalmente religiosas?

Ser negro ou negra no Brasil é difícil, seja em qualquer instituição. Primeiro, devido a um sistema que foi feito para beneficiar a branquitude, e principalmente aqueles que são vistos pela sociedade como “bem-nascidos”. Depois, porque nossos lugares de origem não nos proporcionam a preparação adequada para enfrentarmos as dificuldades impostas, para que consigamos galgar os postos mais privilegiados da sociedade brasileira. 

Na Igreja e em suas instituições religiosas, vemos a dificuldade para encontrarmos lideranças negras que tenham visibilidade. Inclusive todas as inciativas de tratar do racismo e de todos os males advindos dele, que impedem a construção do Reino de Deus, não encontram eco dentro delas. 

O número de padres e religiosos negros é diminuta. Isso se dá pois em muitas comunidades ainda temos um racismo institucional que não possibilita a entrada de vocacionados negros. Além disso, mesmo que iniciem sua jornada a caminho do sacerdócio, enfrentam resistência em muitas instâncias institucionais.

Não podemos esquecer de que a Igreja, suas congregações e movimentos, foram legitimadoras da ideia da inferioridade negra que deram razão a escravidão.

3 – Fale sobre a importância das cotas raciais.

Como disse acima, as negras e negros brasileiros, iniciam sua corrida pela vida em posições inferiores de parte da população que tem acesso a uma boa qualidade de vida. Diante disso, o Estado precisa criar mecanismos que façam esse caminho ser mais equitativo. Uma dessas formas, são as chamadas ações afirmativas, que tem entre uma de suas iniciativas as cotas raciais. Trata-se de um mecanismo que deve ser temporário, mas que só pode ser extinto em um momento em que o país tenha alcançado um grau onde todos, sem exceção, possam ter possibilidade de alcançar todas as oportunidades que a sociedade pode lhe oferecer.

Infelizmente, em um país onde 50,4% da população é negra e parda, a maior parte desse grupo vive uma situação econômico-social degradada. Dessa forma, esse grupo de herdeiros, daqueles e daquelas que foram trazidos para cá como escravizados e que nunca receberam nenhuma compensação por todo esse sofrimento, e pela falta de possibilidades proporcionado pelo Estado brasileiro, devem ser vistos pela sociedade, como aqueles que precisam ter um acesso especial a educação e vagas nos empregos públicos, a fim de que suas famílias, possam receber a compensação devida, através de melhores condições de acesso ao sistema que não os beneficia.

Sendo assim, as cotas são legitimas. Mesmo em relação a uma reparação histórica, quanto social. Nunca vamos ter uma sociedade plenamente desenvolvida se nós, homens e mulheres negras, estivermos à margem da sociedade. 

Como cristãos então ainda é mais complicado. Se cremos no Deus Amor, naquele que enviou seu filho para sofrer por todos os homens e mulheres, fica ainda mais difícil estar em uma sociedade que classifica os seus membros pela cor de sua pele, negando aqueles e aquelas que colocamos como inferiores em tal escala a vida em abundância que está colocada no Evangelho. 

Por isso, as cotas e todas as ações afirmativas são mecanismos jurídicos que devem ser vistos por todos nós como possibilidade de realizar a justiça apregoada na Palavra de Deus.

4 – O Brasil, foi o último país sul-americano americano a abolir a escravidão, como você vê essa informação comparada com os grandes índices de racismo no país?

Para tratar desse temas, temos que lembrar também que devido a revolução no Haiti, onde os negros lutaram pela liberdade e independência, derrotando a França. No Brasil, o medo da revolta negra era muito grande também , pois a maior parte da população era formada pela mão de obra escravizada negra. Isso faz com que se crie formas de deixar os negros e negras cada vez mais distantes da justiça e da possibilidade de viverem de forma digna.

Como nossa formação, inclusive nas instituições religiosas, tem como base uma cultura social e econômica escravocrata. Temos uma grande dificuldade de observar e perceber que existe um grupo que é maioritário e que não tem acesso à justiça social.

A construção de uma ideologia onde o negro é inferior faz parte da matriz geradora da sociedade brasileira. Por isso, o racismo foi naturalizado em todas as nossas relações. O que fez com que tudo relacionado a cultura negra tenha sido inferiorizada, levando inclusive a diabolização de suas práticas.

Por isso, nossos corpos são vistos como objetos que não sente as mesmas dores e necessidades do corpo branco. Essa ideia acaba sendo expressa nas atitudes do Estado e de toda a sociedade que reproduz toda a injustiça e violência que é herdeira da escravidão.

 Para finalizar, deixe uma mensagem para nossos irmãos do Conexão?

As irmãs e irmãos da juventude deixo a mensagem de que o ideal franciscano exige um posicionamento diante de todas as injustiças sociais e mazelas de nossa sociedade. Não se pode deixar a cargo somente dos excluídos a luta por uma sociedade mais justa. Tais grupos precisam de solidariedade e fraternidade. Segundo o Papa Francisco no item 169 da Fratelli Tutti, “ É necessário pensar a participação social, política e económica segundo modalidades tais «que incluam os movimentos populares e animem as estruturas de governo locais, nacionais e internacionais com aquela torrente de energia moral que nasce da integração dos excluídos na construção do destino comum» e, por sua vez, se incentive a que «estes movimentos, estas experiências de solidariedade que crescem de baixo, do subsolo do planeta, confluam, sejam mais coordenados, se encontrem».”

Sendo assim, nós franciscanos e franciscanas, temos que fazer dessa data um momento de todos nós brasileiros e brasileiras, deixando de lado os relativismos que aqueles e aquelas que veem no mundo uma réplica de um céu ufanista, onde todos tem os mesmos direitos e as mesmas chances de viver bem, ou daqueles que falam de meritocracia como se o mundo em que vivem fosse justo.

Desta forma, todos e todas, sem se importar com sua origem étnica, precisam abraçar essa data e dar um basta ao mal que leva nosso país a ser dividido em seres humanos de primeira e segunda categoria.

Gratidão Jefferson, pela sua disponibilidade e partilha! 

Temos muito a aprender e crescer como  irmãos, e isso passa por saber a nossa história, conhecer, ter a empatia que nos leva a luta e a união de forças para mudar a nossa sociedade. Cada um precisa assumir seu papel, e assim veremos um mundo mais fraterno e humano. Nós acreditamos que é  possível, e você? 

Deus te abençoe!

Um abraço da Ana e da Victória 

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