Em Fraternidade: “Essa missão não é só minha”

É com muito orgulho que a coluna “Em Fraternidade”, está de volta. Já reza o ditado que a primeira impressão é a que fica, por isso, nós do Conexão Fraterna começamos 2020 com um lindo relato da jovem Aline Neves, natural de Nilópolis (RJ), que atualmente faz uma experiência missionária na Diocese de Barra (BA), como voluntária na Paróquia Nossa Senhora da Piedade. 

Segundo ela, já se passaram dois anos desde que chegou às terras baianas da Cidade de Brotas de Macaúbas (BA), no povoado do Cocal, que conta com mais de 25 comunidades do sertão da Bahia. Frei Moisés Beserra de Lima é o pároco local. A Diocese de Barra é pastoreada por Dom Luís Flavio Cappio, bispo franciscano pertencente à Província da Imaculada Conceição do Brasil.

“Aqui reconstruí minha vida. Reacendeu a chama que estava apagada dentro do meu coração”, revelou Aline.

Leia o texto na íntegra:

Eu sou Aline Neves da Paróquia Nossa Senhora Aparecida da cidade de Nilópolis (RJ).  Estou em missão no semiárido da Bahia (BA), no povoado do Cocal que pertence a Paróquia Nossa Senhora da Piedade.

Comecei a frequentar a Igreja logo depois que fui ao batizado de uma vizinha na comunidade Nossa Senhora de Fátima, que fica próxima da minha casa, logo em seguida eu pedi aos meus pais para que me colocassem na catequese e, desde então, eu não saí mais da Igreja. 

Conforme os anos foram passando, fui me envolvendo cada vez mais dentro das atividades da comunidade, como a catequese, a perseverança, o crisma e o tão conhecido Grupo Jovem,  que foi de extrema importância para minha caminhada de fé. Foi no JUNA (Juventude Nova Aliança – PJ), que comecei a entender a missão do nosso batismo. Foi com minha amada PJ que eu conheci as lutas sociais, os direitos da juventude, as políticas públicas e participei das primeiras missões nas casas de repouso para idosos. Ali foi plantada uma sementinha que ficou sendo regada, crescendo  através do serviço da Pastoral da Juventude. Logo em seguida veio a catequese e várias outras oportunidades como a pastoral do teatro, pastoral do negro, pastoral do menor o EJAC.

Por muito tempo coordenei o grupo jovem e a catequese em minha comunidade que muito me deixava feliz e realizada. Eu tinha um forte laço afetivo com aquela comunidade e paróquia e com todos que ali estavam, esse sentimento se fortaleceu porque eu tive pessoas que  viram Cristo dentro de mim e insistiram em me mostrar isso. Pessoas como minha amiga Roberta que foi coordenadora da PJ em nossa paróquia e da também fez parte da catequese. Ela me inspirou muito com sua dedicação e esforço para que as pastorais caminhassem com seus projetos de levar Cristo a todos. Nesta caminhada muitas pessoas foram passando pelo meu caminho, algumas deixaram marcas que jamais irão se apagar. 

Uma delas foi meu amigo e irmão em Cristo Frei Diego. Esse frade franciscano surgiu junto com outros frades em nossa paróquia para fazer seu estágio. Empolgados, dispostos e cheios de Cristo no olhar. Fizeram um lindo trabalho acompanhando as pastorais e os movimentos. Sua presença aqui foi tão forte que seu vínculo com a paróquia e seus paroquianos permanece até hoje.

Porém, os anos foram se passando e tivemos algumas mudanças na administração da nossa paróquia. Com a troca de Pároco o rumo dos trabalhos também mudou. A minha comunidade também aderiu às novas mudanças administrativas, e percebi que outro espaço também precisava de mim, então fui para a comunidade São José a convite de uma das agentes pastorais de lá que pediu ajuda na catequese. Lá fui muito bem acolhida e permaneci por alguns anos, mas meu coração ansiava por mais. 

No meio dessas mudanças surgiram as Caminhadas Franciscanas e por convite do Frei Diego comecei a participar e mobilizar os jovens a irem também. Ir às Caminhadas e estar perto dos frades com toda mística franciscana era um bálsamo para meu coração. Quando eu estava com eles eu reconhecia minhas origens, aquele vigor de antes. E assim fui participando das caminhadas e de um encontro provincial. Nesse encontro eu tive a oportunidade de me confessar com o Frei Diego, coisa que já não fazia a tempos.  Eu lembro que falei para o frei na confissão que meu coração já não mais ardia com os trabalhos que eu estava me doando na comunidade e na paróquia e sabiamente ele me disse: “existem momentos na vida em que é necessário jogar a rede em águas mais profundas”. E eu guardei isso em meu coração. Passou-se dois anos e eu continuava com o coração do mesmo jeito e dentro destes dois anos eu fui a São Paulo junto com meu irmão para assistir algumas aulas da minha pós-graduação em política públicas. Não posso deixar de falar, irmão esse que seguiu os mesmos passos que eu, liderou a segunda geração do meu grupo de jovens, fez as caminhadas, missões e encontros franciscanos da Província. Segue firme defendendo a juventude, os pobres, construindo a civilização do amor. Voltando a São Paulo em uma destas idas à aula fomos almoçar no Convento São Francisco a convite de Frei Diego e lá ele me falou de uma missão no Sertão da Bahia. Na hora fiquei animada, porém eu não consegui ir.

No ano de 2017, na missão em Curitiba, fomos eu e um grupo de jovens da paróquia que ajudei a mobilizar. Essa missão foi maravilhosa, me despertou um sentimento de querer mais, de ser ‘Igreja em saída’ concretamente. Neste mesmo ano Frei Diego me ligou e me convidou para ir novamente para a Missão da Bahia tendo inclusive uma parte do translado custeado.  Na mesma hora o sol se abriu para mim como se Deus naquele momento dissesse dentro de mim: “vai que você vai me reencontrar lá”. E no mesmo dia, todas as burocracias necessárias foram resolvidas. Isso tudo foi no mês de julho, inverno na região da chapada Diamantina, período de seca. Quando cheguei e vi aquele lugar com aquele barro vermelho cercado de montanhas e morros secos e verdes, tudo misturado, e aquela igrejinha com um grupo de pessoas nos esperando para nos dar um abraço, regado de fogos para nos receber, quando entramos dentro da igreja uma emoção tão grande bateu dentro de mim que eu olhei para o Frei Diego e falei que estava emocionada, e ele disse “eu também”! E ali já era Deus falando: “minha filha você me reencontrou”.  Ali, vivemos dias de muito trabalho, muita sola de sapato gasta, e muito carinho e amor recebido desse povo simples, acolhedor e cheio da presença de Jesus Cristo. Aqui eu vi Cristo na face de cada um que tive contato.

Na última noite tivemos um momento com a juventude que foi um divisor de águas na minha vida, junto com Frei Gabriel eu apresentei o programa #PazeBem. Foi muito divertido! Ao final do programa começou um momento de animação no qual a juventude e todos ali se emanam de uma alegria fora do normal, que só poderia vir da presença de Cristo. E naquele momento eu senti muito forte meu coração queimar como nunca havia sentido, porém guardei este segredo comigo. No domingo, a despedida foi algo muito fora do comum, as pessoas estavam muito emocionadas e eu mais ainda. Foi muito doloroso ir embora, mas foi preciso, pois a missão ali havia acabado. Quando cheguei em casa meu coração continuava no povoado do Cocal, e o desejo de voltar só aumentava.

Ao ir embora, Frei Moisés, Pároco da Paróquia do povoado de Cocal, onde a missão aconteceu, fez o convite para voltarmos nas festas de setembro, da padroeira. Meu coração queria, mas meu desejo era de fazer uma experiência de passar um tempo longo no povoado ajudando na paróquia que estava em formação. Então liguei para Frei Diego, e disse que queria fazer outra experiência de 12 dias e ouvi: “acho que você deveria ficar um ano”. Era tudo que eu queira ouvir, porque era isso que eu guardava em meu coração.

Então, em setembro daquele ano eu retornei e ajudei na festa. Fiquei os 12 dias e voltei determinada a fazer a experiência de um ano. Trabalhei por dois meses direto juntando o máximo de dinheiro que eu pudesse para vir viver essa missão, no qual meu coração estava clamando. Esses dois meses foram os mais sofridos. Abateu-me um estágio depressivo porque eu já não queria mais ficar no Rio de Janeiro, meu coração ansiava arduamente vir viver minha vida missionária nesta paróquia com esse povo. Minha família vendo o quando eu estava triste e infeliz, compreenderam a necessidade e me deram todo apoio. Sei que para meu pai, minha mãe e meu irmão não deve ter sido fácil me ver indo embora do convívio deles, porém o amor que eles sentem é tão forte que eles preferem me ter longe e feliz do que me ver triste como eu estava naquele período. Esse foi o momento mais difícil, me despedir deles, no entanto logo Deus foi preenchendo a dor da despedida com a alegria da chegada. Ainda no aeroporto as mensagens via Facebook, do povo de Cocal diziam “ela está chegando”, e todos expressando como estavam felizes com minha ida para lá.

Em dezembro eu vim com a idéia de ficar dois meses, mas no coração o desejo que tudo desse certo e eu pudesse viver essa experiência por mais tempo. Fui acolhida por uma grande amiga, a Mônica, que abriu as portas não só da sua casa mais da sua vida para eu entrar. Fiquei morando um tempo na casa dela. Logo que cheguei frei Moisés já foi me dando vários trabalhos para desenvolver na paróquia. E conforme a missão foi acontecendo eu consegui um trabalho como professora, aluguei uma casa e fui construindo laços de afetividade com o povo, o lugar, os costumes, as crenças,  o meio ambiente, as bandeiras de luta e com tudo que tem aqui na Bahia.

Essa missão não é só minha. Tive ajuda de muitas pessoas. Mesmo longe, Frei Diego sempre me dá apoio e orientação.  Já se passaram dois anos que estou aqui na Cidade de Brotas de Macaúbas (BA), no povoado do Cocal, na Paróquia Nossa Senhora da Piedade, com suas 25 comunidades. A minha missão continua de maneira mais branda, pois eu trabalho na escola os dois turnos e a noite dou aula de zumba, ginástica e treino funcional para as mulheres do povoado, e continuo a serviço da paróquia. Aqui reconstruí minha vida. Reacendeu a chama que estava apagada dentro do meu coração. Hoje sou ministra da palavra e da eucaristia e  ajudo em tudo que a paróquia necessita. Agradeço também ao Bispo Dom Frei Luiz Cappio pela confiança e carinho comigo e minha vida missionária.

Jovens, partilho com vocês que a minha vida é conduzida por Deus, eu tenho o forte desejo de construir uma família, mais a vida  missionária faz parte da minha essência. Então hoje estou aqui porque é vontade de Deus, aonde Ele me mandar eu irei. Tenho um grande desejo de fazer missão na África, mas por um tempo curto. Porém, o que Deus reserva para mim eu confio e aceito. Quando eu vim para Bahia meu grupo de amigos que eu amo muito fez um vídeo e colocou essa música, que retrata o que eu sinto em relação a Deus.

“Chamas por mim, ouço sua voz. Que queres de mim, ó meu Senhor? Estou aqui, ao seu dispor, servo fiel a tua vontade eu serei. Teus planos vão além do eu possa entender. Quem sou eu para merecer tantas graças assim? Meu sim eu quero te dizer, querer o teu querer, e assim viver, pois já não posso mais calar a voz que grita em mim…”.

Desejo que todos vocês ouçam a voz de Deus dentro do seu coração. Permita que Ele conduza sua vida e a felicidade virá!

Fraterno abraço, cheio de saudade! Paz e Bem,

Aline Neves, missionária!

One comment

  1. Aline,que história emocionante ,obrigada por escolher as terras sagradas do sertão baiano para fazer seu reencontro com Deus .obrigada pelo seu esforço para com nossa paróquia é com nossas comunidades.
    PAZ E BEM

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